quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Depois

A seda do cabelo
suado
profanando a palidez
da fronha

os gestos
pela metade

o riso
frouxo
mas delicado;


- eu te amo...

alguém conta
em segredo
com os olhos
apertados.

Uma mão
busca a outra:
os dedos trocando
os códigos
sutis
da cumplicidade.


- Mais que tudo...

responde o eco
e os pés se encaixam
magnéticos
em meio ao berço
bom
do escuro.

Macio
chega o sono
e faz em mármore
aquela cena:

esculpidos
um no outro

complementares

necessários

naturais

vazios:

dois pequenos
animais
no frio.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

A vendedora

Passeando por um
país
onde não entendo
as placas
não entendo as ruas
não entendo, na verdade
porra nenhuma -

estou perdido

e irritado.

Dobro esquinas, macaqueio informações
interpreto
mapas;

nada.

Inconsolável
passo na frente de uma loja
e olho demoradamente os números
dos preços
meus últimos amigos
calados e nobres como toda
a matemática.

No interior
da loja

uma jovem
vendedora
está de cócoras.

Não deixo de notar que
ela
sem saber
expõe o engraçado
vale
entre as formosas fatias
de seus belíssimos
glúteos.

Ela se ajeita devagar.

Carinhosamente

olha para trás.

Me vê.

Sorri.

Eu sorrio de volta
quase que
em
agradecimento.

Logo
ela continua, vendendo

e eu continuo
um pouco menos
perdido.

Interessante como
mesmo uma bunda
às vezes
é um mundo.

Ou vice
versa.

Kitsch

um gatilho iluminando
todo um continente
de possibilidades

a morte, o som
escuros
como o último útero
impregnado.


é manhã
a mais

tenra manhã

mas
o derradeiro projétil
já percorre o corpo

lento
esperto

um besouro
carnívoro

e paciente:

a unha arranha o quadro
e o mundo se contrai sob seu domínio inconcebível.

ainda bem que há o cinema
americano
os sanduíches os sorvetes os bichinhos
de pelúcia ---
toda, toda essa
tralha

para nos
igualar.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

"De costas" ou "El gran masturbador, Dalí, 1929 - óleo sobre lienzo"


pequenos
órfãos
detentos
órgãos
sob a pele -

amores.

quatro câmaras
os comportando

mas quantas flores

sem estação?

pelo visto
nada é apto
e
há muito
mais xisto
que o previsto
hirto
espaço calcário:

um vaso todo
lado de dentro.

os dentes
sonham
fadas distantes
sedentos
pelos ossos
sobre ossos

os pelos
nossos

ambos fossos
fundos
frutos -
sementes tardias
elaboradas com
um
riso exausto.

meu leito
arco firme
contra a noite
que calcula tantos
quando estou só

a seta
que inveja
o branco
do nascente:

entre as unhas
extrai-se o rubro

e entre as coxas
nossas próprias
respostas.

pena
quando surgem
estarmos
de costas.