sexta-feira, 28 de agosto de 2009

A corrente do dia

na varanda

o cigarro aceso
olhando a rua em marcha.

como a brisa
que refresca
dois ou três poemas
batem leves
na porta
e me entregam as cartas
já velhas e marcadas
conquanto valiosas
da contemplação.

vejo folhas
alaranjadas
e bicicletas
muros
e mesmo
exércitos, quem diria.

outros são bolhas
ora transparentes
ora
coloridas -

até chegam a estourar
bem ali diante dos
meus olhos

arregalados.

mudo
como somos
nada efetuo
até que o momento
pano muito curto
se encerra.

ele acaba, eu
acabo

e também o cigarro
acaba.

arremesso-o:
seu corpo sofre
e cai
dilacerado
no andar inferior.

sei que alguém o achará
e herdará
um pensamento repleto
de dúvidas e tantas
outras
coisas estranhas.

mas ai
já não é mais
problema meu.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Do outro lado

Quando primeiro te vi
--- tão hirsuta a tua face!
pensei logo nas roupas novas
que exibias sem notar.
Logo, ali me estacionei.

Não deixei pesar teu nome
mas adverti - como vai?;
e ao virares como máquina
sabia que já julgavas
todo esse meu avatar.

Nos espaços do sorriso
falso que me encomendaste
imaginei-me entre o préstito
da tua resiliência -
tuas mãos me carregando...

Portanto, conheci a tumba
sob o modelo de esquife
dos teus óculos-escuros.
A tua resposta tão breve
meu lacônico elogio...

domingo, 23 de agosto de 2009

Ela

Agora
que nossos dados
nunca acertam a soma;
que nossos
isqueiros
curtem outros bolsos e
ignificam
outras chamas

e o provador
de roupas tão
caras
que teu peito
insistente enquadra
redunda
o nada
entre reflexos;

agora
que somos dois
encarando um ao
outro -
olhos trancados
do lado de fora;

que não escolhemos mais simpatias
para acalmar
as feras
no zoológico
de nossa antecipação

e os vagos
gráficos
da nossa íntima
economia
jazem, francos
como o outono.

E nosso idioma
não resiste
à peçonha
das heras:
flora do dialeto
que plantamos.

E as lágrimas
não têm mais o chumbo
que outrora
algum valor
lhes dera.

Agora

nada
mais

nos

ela.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Remember when we were in Tokyo?


- The robots-
All the stars:
toy plastic cars
that urge to come and go.

- The tragic
novelty
of neon blood
stains.

An eulogy
over a pile
of darkened broken bones

the misfit of
glass
in the break of
a smile.

And there is
flame
blue green white
flame
lighting the cigarettes
of every
well-intentioned
devil
that chooses to walk the street, every
devil
that chooses to laugh
instead of surrendering
to the meditating light bulbs
of the endless corridor
where all the love
turns into
blurred make up
and
tired handwriting.

The wind is high
fresh
and sound.
The flesh is made out
of Ginza’s
shopping bags.

The quilt
of the mind
and the hammer
of the
heart
are
fed
eternally
to the electricity
under my knees.


-The haze-
Your breath
perceived the incoming aircrafts
stopping
in prayers
for every fraction
of their noisy flights.
Every atom of your will
gathered in peace
defeating the beauty
of the static sun.

My hands
warm against your want;
our lips
cotton dreams
woven in a red and white
unrehearsed
play.
The afternoon spoke
slowly
whispering
revealing jokes
of unthinkable
blasphemy.

The careful leaves of the sakura
lifeless, fearless
sheets of grace
hovered as the cranes
who love their nests.

Both our eyes
both our hearts
knew the matter
- living matter
that delivers chills
like childish kills
to our back
when the city's
furious kiss
hits the
unwary snow.
-The saints-
In the funny
peaceful temple
we drank water
so it would
purge the soul
(even though
all our thoughts
meandered
turning old
the cobblestones
of loneliness).

The happy animals
who roamed free
asked with
humble eyes
while
they sat about -
when will the firmly rooted heart
wither
drowned by the fearful tide
of the cutting night;
when will the hands become useless tools
meaningless weights
instead of
cosmic knots?

Pass the atmosphere
where the air is brief
we could be forever
wrapped in lightness
and white
but in here
despite the prayers
the clapping
the incense
the faith
- plus, the
firm demanding
of the adamant
earthquakes -
all we can be
is a half.


- The crow-
A bird
against the light;
the streets eager
for the easiness
of meat.

No peace -
nothing in the pace
of history.
A centipede
with a million eyes
roams
watching every one
of my
infinite sides..

Is it pain
is it sadness
that I speak to
when I wander
right onto
the photograph
of your
warm reeds?

- The river
keeps on
not unlike
infinite swords.

My wrists
ache
under names
I can’t regret
and my walls
all carry
messages
in complicated
ideograms.

There are so many faces
in only one smile;

so much waiting
in an airport
where there are

no landings

and where
steel concrete iron wires glass hurt

compose the best
of a confused
whilst everlasting

landscape.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Sono sobre rodas

Cidade da noite, apetrecho
do asfalto celeste. Lua volante
blues atlântico no rádio
e um onírico acelerar
sobre o carbono e o enxofre.

Insetos estelares no
parabrisa do edifício.
O on/off do meu a/c.
Velocidade prostrada.

Acostamento com appeal:
manhã. Surge a alvorada -
Alva Rd. -, viagem de
carona e solidão.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Madrileña

primeiro: houve o encanto
de seu corpo
teso -
não sei dizer!

algo vegetal, macio
mas com um certo vermelho
e, claro
no embrulho
de sorrisos incompreensíveis.

logo: sua parte
nas entrecenas

a volúpia branca
de um mero mastigar -

em cada gesto um
gato

lento

lascivo

notívago

a progredir...

enquanto os olhos
bolasdegude
me corrompiam

sua língua
ecológica
se poupava, mas
ardia
encrispada
como uma lagarta
quando sonha
em nos queimar;

músculos
todos cordasvocais:
o rondar do touro
ao farejar seu
próprio sangue -
orando pelos aplausos
de um mísero golpe.


nunca soube eu antes de beleza
rica, oculta

tão inseto;

brumas lúdicas -
cordabamba lúbrica
todas esquinas numa enorme

cidade-mulher.

domingo, 9 de agosto de 2009

Um pai

um pai
é tudo aquilo
que não é vento:
nuvem tranquila
que nunca cai.

como algo pago
já se faz nosso
independente;
além da vista
a ser profundo
e presente:

um pai
sabe seu filho
como um deus
maltrapilho
ama o seu
pequeno mundo

e cada voto
de seu medo
(que revela
entre os lábios
na noite quente)

é uma rima
das mais sábias

ou uma prece
macia e bela
clamando pelo
filho doente:

cabe a ele
triste ou ledo
ser o punho em riste
que nunca falha
e sempre faz ---

coubesse em mim
um todo e meio
queria, assim
o bom império
de ser um pai...

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Reflexo

sob as ondas
um castigo
recôndito laborioso:

não
há preces
na fogueira
que queima com meus arbustos

secos galhos que me compôem.

a dúvida, sempre primeira
mais humana entre
todas as
quimeras.

nossa mão
estranha que explora
o próprio ventre:

o calor
das épocas...

quem o possui
e quem
lhe
pertence?



entusiásticas
sopranos
altas esferas da minha
identidade

acho
que ainda
um dia
sonharei
que sou eu mesmo
de verdade.